O desafio da Educação nos “novos tempos”: e o que seriam os “novos tempos”?

Quero compartilhar nesse texto alguns trechos da uma famosa série canadense chamada “Anne with an E”. 

É uma série Netflix de 2017, baseada em um best-seller canadense de 1908 chamado “Anne of Green Gables”, que conta a história de uma menina órfã muito idealista, adotada por 2 irmãos sem filhos que assumem legalmente o papel de pais dela. A história se passa na província de Ilha do Príncipe Eduardo, no Canadá, numa região rural ainda sem energia elétrica. 

Eu recomendo essa série, que nos faz refletir e repensar de um jeito inusitado, por meio do olhar e das falas de uma criança, sobre muitos aspectos sociais, que parecem “antigos” mas que ainda estão enraizados em nossa sociedade.

A série aborda o feminismo, o bullying, o preconceito, o racismo, a escravidão e a ganância de uma sociedade.

Anne, a protagonista, nos lembra que as coisas mais simples do mundo podem ser magníficas e que a imaginação e a bondade podem nos ajudar a enfrentar todas as situações da vida.

Ela descobre que: “A adversidade pode ser uma benção”

E é justamente isso que estamos vivenciando, em razão da pandemia, no mundo todo e, sobretudo, na educação. Por isso, trago aqui alguns trechos do último episódio da segunda temporada, que traz uma reflexão justamente sobre esse tema. 

Nesse episódio se discute a demissão da nova professora que chegou na escola da cidade, propondo métodos novos e mais participativos de ensino. Ela estaria sendo expulsa da escola pelos pais insatisfeitos com as novidades.

Os trechos que se seguem são referentes a uma reunião entre os pais dos alunos e a diretoria da escola. Neles podemos ver a diferença no discurso de um professor tradicional “daqueles tempos” e da nova professora “revolucionária”:

O discurso do professor tradicional, sobre os princípios da educação:

“O objetivo da educação é criar uma força de trabalho melhor, com ênfase no bom comportamento, na habilidade de seguir instruções e no uso da memorização. A memorização e a declamação garantem uma educação apropriada. A repetição é a chave do aprendizado. Não existe lugar para brincadeiras e atividades sem sentido. Compreender conceitos ou idéias não têm valor dentro de nossos objetivos. É necessário impor regras e manter a ordem. Ensinar alunos a serem obedientes. Eles precisam respeitar os mais velhos e ter moralidadeCrianças devem se calar e respeitarDevem ser pontuais e organizadas”

O discurso da nova professora, chamada Srta Stacy:

“Eu me fiz uma pergunta que agora faço para vocês pais: – O que é mais importante reforçar na educação de seus filhos? O preconceito? O medo?

A pergunta fundamental para fazerem a si mesmo é: – Seus filhos estão aprendendo com os novos métodos? Creio que a resposta é sim.  

Mudanças são desconfortáveis, pois o futuro é desconhecido. No entanto, o futuro chega rapidamente feito um trem. E eu farei o melhor que puder para que suas crianças estejam preparadas para ele. Entendo que meus métodos sejam incomuns. Nas aulas práticas a participação ativa, se provou mais efetiva do que a aprendizagem mecânica. Por que não os incentivar a pensar por si? Por que só ensinar o que veio antes? Recentemente alguém sonhou com o telégrafo, com a eletricidade, com o motor a vapor. Aposto que não faz muito tempo que o trem foi considerado rápido demais. Uma inovação perigosa. Mas podem imaginar nossa vida sem ele agora? Sonhadores mudam o mundo. Mentes curiosas nos impelem para a frente. Minha intenção é formar alunos fortes, com futuros brilhantes não só para eles, mas para todos nós. Para a nossa sociedade. Por isso estou aqui!”

Nesse momento entram as crianças na sala levando lâmpadas acesas em batatas (experimento que realizaram e aprenderam em sala de aula com a professora Stacy) 

Discurso de uma das alunas:

“O que acabam de testemunhar é produto dos métodos da Srta Stacy. Ela nos ensinou sobre eletricidade, mas também nos mostrou o espírito do entusiasmo e da curiosidade que precisávamos para fazer isso. Ela é uma inspiração. Aprendemos mais com ela em uma semana, do que no último ano. Ser diferente não é ruim, é só não ser igual! Sempre existe outro jeito de ver as coisas. Ela é a chance de sermos mais do que somos hoje e de realizar nossos sonhos.”

O depoimento de uma mãe, que é favorável ao método da prof. Stacy:

“Como alguém que viveu sem mudanças a maior parte da vida…e depois vivenciou uma mudança drástica, posso atestar que essa é a única maneira de crescer e aprender”.

Esse episódio da série retrata um momento de revolução na educação, uma transição de um contexto de controle e autoritarismo para um ambiente de maior inclusão e participação do aluno e dos pais, não só no ensino, mas também na construção de uma sociedade mais preparada para o futuro e para as inovações.  

Assim como na série, entendo que estamos vivendo agora uma grande transição e/ou revolução na área da educação, iniciada por mudanças sociais, políticas e econômicas de cada país, mas acelerada pelo contexto mundial da pandemia.

Ainda fazendo uma correlação da série com o nosso momento atual, quero me permitir refazer algumas das perguntas e das reflexões, assim:

  • Qual é o nosso novo desafio com a educação no contexto atual? Qual a “revolução” de que precisamos agora?
  • O que seria para nós hoje – o novo? 
  • O que pode impulsionar as nossas crianças para estarem mais preparadas para o futuro? 
  • Quais os valores verdadeiramente queremos transmitir aos nossos filhos?

E aprofundando um pouco esses pensamentos, me pergunto ainda:

  • Como temos valorizado o ambiente da escola e os profissionais da educação?
  • Como está a capacidade das instituições educacionais e a nossa capacidade de adaptação?
  • Como está o nosso compromisso com o aprendizado independente do contexto e da forma, o nosso respeito e empatia com o outro em qualquer contexto?
  • Como está o nosso respeito às diferenças?
  • Como está a nossa capacidade de agir juntos, como sociedade, para pensar em soluções que apoiem essas instituições a se manterem vivas mesmo na crise? mesmo quando nossos salários ou empregos estão afetados?
  • Quem são os seres humanos que estamos formando para o futuro?
  • Quais os valores queremos transmitir e estamos transmitindo?
  • Temos consciência deles?
  • Temos conseguido despertar o espírito de curiosidade e entusiasmo em nossas crianças/adolescentes?
  • Conhecemos os sonhos de nossos filhos?
  • Esses sonhos incluem uma sociedade melhor, menos discriminatória e mais aberta às diferenças?

Enfim, essas e tantas outras perguntas me tomam ….

Acho mesmo que essa mudança drástica que vivemos nos fez aprender e nos fará aprender muito sobre tudo aquilo que nem conhecemos ainda…o NOVO!?

E que novo é esse? Que novo será esse? Que tempos são esses que estamos vivendo? Do que chamaremos “esses novos tempos” no futuro, quando olharmos para trás?

Finalizo com a frase recitada por Anne no final desse episódio:

“Me diga e eu esquecerei. 
Me ensina e eu me lembrarei. 
Me envolva e eu aprendo”

Benjamin Franklin*

Saiba mais sobre a biografia de Benjamin Franklin* logo abaixo….uma grande inspiração para a humanidade!!

Carla Merlina Gennari

Baku, 12 de junho de 2020.

* Benjamin Franklin, americano que por ironia, deixou os estudos aos 10 anos de idade e começou a trabalhar aos 12 anos. Trabalhou como impressor e depois se tornou jornalista e editor, fundou a 1ª biblioteca publica da Filadélfia, fundou a Universidade da Pensilvânia e a sociedade filosófica americana, sempre se preocupando com assuntos públicos. Aos 50 anos fez descobertas sobre a eletricidade e meteorologia deixando também a sua contribuição como cientista. Aos 79 anos dedicou-se à abolição da escravatura, tendo-se tornado presidente da sociedade que visava a esse fim e à libertação dos negros ilegalmente retidos em cativeiro.

Uma resposta para “O desafio da Educação nos “novos tempos”: e o que seriam os “novos tempos”?”

  1. Excelente texto Carla, eu e Alice adoramos Anne… Sobre essa nova forma de educação…ai..eu tenho tantas incertezas maquiadas de certeza, que confesso que é muito dificil definir alguma direção unica, mas nessa quarentena percebi que, Alice precisa sentir, tocar e viver o ensino, e isso em aulas online não é possivel para ela, se sentia triste e pressionada a mandar os exercicios por obrigação, e se cobrava muito. Percebi que sou capaz de ajudar minha filha muito mais que imaginava e o momento em que ela ficava mais feliz era quando eu estudava com ela, fazendo atividades ao ar livre, vendo um video e discutindo sobre ele, etc… a vida digital para Alice não é saudavel, ela definitivamente não gosta. Então a simplicidade das minhas aulas fazendo experimentos, brincando, estudando plantinhas no parque, sentadas na varanda olhando o céu e e falando sobre o Universo, planetas e estrelas é o que a faz feliz, e onde ela mais aprendeu…estar presente, simplicidade, sentir, tocar e aprender juntas sentadas numa grama embaixo de uma arvore frondosa é onde somos felizes, mesmo com esses novos tempos vindos por ai, manteremos aqui em casa o homescholling raiz…sem tela…isso é o que funciona com Alice, cada criança é unica e deve ser ouvida, eu ouvi minha filha e ela me disse, mamãe já que não posso ir a escola, você pode se minha professora? sim minha filha, buscarei recursos e farei o melhor que puder, uma professora particular para ajudar, homescholling, seja o que for…vamos nos adaptar pois é necessário mas sem perder a sua essência…a liberdade que tanto prezamos para ela. Nem todos os pais infelizmente tem essa oportunidade que tenho de estar com minha filha 24 horas, tenho sorte e agradeço muito por isso.

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